terça-feira, 7 de julho de 2020

Lauro Rocha Andrade. Um Legado deixado





Lauro Rocha Andrade. Um Legado deixado

“Ex-funcionário da Marinha Mercante do Brasil na década de 60, foi deputado estadual, prefeito por dois mandatos em São Cristóvão, guardião da Memória e História Sancristovense.”

Adailton Andrade é historiador, membro do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, membro do Movimento Cultural Antônio Garcia Filho da Academia Sergipana de Letras e faz parte da Academia Sancristovense de Letras e Artes.  

Lauro Rocha nasceu no dia 21 de julho de 1936 em São Cristóvão, Sergipe. Filho de uma família muito sem perspectivas de vida, perdeu o pai ainda muito pequeno. Ao saber da passagem de um circo por sua cidade, não hesita: vai conhecer o grupo e participa da sua rotina. É no mundo das lonas que consegue seu primeiro emprego: era um mata cachorro (uma espécie de faz tudo - auxiliava a todos lá dentro e ainda vigiava o acesso das pessoas para garantir que ninguém entrasse sem pagar).  Assim que acaba a temporada em São Cristóvão, o circo vai embora para a cidade do Rio de Janeiro e Lauro Rocha o acompanha. Era década de 1940.

       (Foto: Acervo da  família  )

Chegando ao Rio de janeiro, passou por muitas provações e dificuldades. Longe de tudo e de todos, sobrevive entre pessoas desconhecidas e tudo isso faz com que sua vida fosse envolvida com mais sofrimento. 

                                      (Foto: Acervo da  família  )
Ainda carregando nas costas a menor idade, um dia conheceu Valmir, um militar da Marinha. Tornaram-se amigos e foi ele quem ajuda o jovem Lauro Rocha e o leva para a Marinha Mercante do Brasil. Começa então a ter uma oportunidade de amenizar todo sofrimento vivido, afastando até o fantasma da fome e do frio.
Serviu à Marinha Mercante por 10 anos e teve a oportunidade de conhecer outros países - Alemanha, Holanda, Espanha, Portugal dentre outro. Maravilhou-se com as diversas culturas e isso o inspirou a perceber o quanto é importante o investimento na educação.


Foi suboficial e representante da categoria no sindicato. Por conta desse envolvimento com as causas coletivas, começou a participar ativamente da política. Quando retornou para São Cristóvão, logo após o golpe militar em 1964, participou diretamente da eleição de 1966.
Laura Rocha teve um papel importante no desenvolvimento de São Cristóvão. Somou forças junto à sociedade sergipana na época e contribuiu na construção da “Cidade Universitária Prof. José Aloísio de Campus” por meio de ações em sua primeira gestão como Prefeito de São Cristóvão (1977/1982). Com o gerenciamento cuidadoso dos impostos recolhidos das construtoras instauradas no munícipio na época, conseguiu reverter esses recursos financeiros em melhorias para a cidade. Em sua administração, foi realizada a construção do Mercado Municipal, reformas de diversas escolas na cidade e a pavimentação em paralelepípedos de diversas ruas do centro histórico.
Para registro dessas lembranças sobre as realizações do Sr. Rocha à frente do executivo municipal, mister anotar os agradecimentos ao Sr. Valmir Passos, secretário em suas gestões; Sr. Jorge do estandarte; Carlos do Serviço Militar; Dr. Carlos Pinna, atual conselheiro do Tribunal de Contas e Alex Rocha, seu filho. Essas pessoas, de forma descontraída e empolgada, não tiveram dificuldades em lembrar esses feitos deixado por Lauro Rocha e narrados aqui.


As marcas do bom gestor público podem ser encontradas em diversas áreas em que Lauro Rocha se debruçou. Na habitação, na educação, na assistência social e no trato com o servidor público pode-se afirmar que foram suas principais preocupações.
No campo da habitação, Lauro Rocha também atuou na concretização do sonho de muitos filhos de São Cristóvão, ávidos por ter seu próprio teto. Os loteamentos “Nova Divineia” e “Lauro Rocha” são marcas disso.

 O loteamento “Nova Divineia” foi fruto de desapropriação da área junto à Indústria de Tecidos Pedro Amado “Fábrica Velha”, em detrimento de um passivo tributário.  Com o objetivo de reduzir ou zerar o déficit imobiliário e desenvolver o município, foi desenvolvido um projeto e por meio de DOAÇÃO de lotes a pessoas da cidade. Foram terrenos de tamanho significativo. Uns mediando 8m por 30m; outros, 15m por 30m. No primeiro momento os beneficiários recebiam um documento de Foramento e se beneficiasse até os 02 anos, conforme contrato previamente definido, eram liberados para escrituração cartorial. Hoje o local se transformou num grandioso bairro de São Cristóvão.
O Loteamento Lauro Rocha trilha caminho parecido. Nasceu com o mesmo objetivo da Nova DIVINEIA, só que desapropriado junto à Indústria São Gonçalo - “Fábrica Nova” e Que pertencia à época ao Grupo Votorantim. O loteamento tem crescido e recebido alguns beneficiamentos (pavimentação, iluminação dentre outros), apesar das dificuldades por que tem passado o nosso município no momento.
Na Educação, ele construiu, reformou, ampliou todas as escolas municipais existentes, inclusive nos povoados Areia Branca e Mosqueiro que eram ainda administrados por São Cristóvão e que hoje se encontram sobre a tutela de Aracaju. Criou o Colégio São Cristóvão, com recursos próprios, implantando uma Escola Profissionalizante - técnico em Contabilidade. Dessa escola saíram vários profissionais contábeis. Importante lembrar que foi uma inovação para o Estado de Sergipe.
No terreno cultural, incentivou as tradições populares, mantendo viva a história e a cultura de seu povo, como a festa do mastro, no espaço do Sr. Acioli.  Promovia a produção de fogos, incentivado a tradição de Guerra de Buscapé. Os grupos folclóricos sempre tiverem apoio na sua gestão, ressaltando a memória dos velhos carnavais, nas tradições juninas, incentivando e todas as tradições culturais da cidade.


Criou a galeria dos ex-prefeitos, que esteve sempre à frente o ator e produtor cultural Sr. Erundino. Deu incentivos a organização do Arquivo Municipal, restaurou as ladeiras do Porto da Banca e a Ladeira do Açougue no formato de original. Ainda com o intuito de resgatar a cultura musical, faz ressurgir a banda de música. Convida o senhor Zeca  Funhê, para dar continuidade a um trabalho deixado pelo maestro João Batista Prado. O evento deu oportunidade a muitos jovens a aprenderem uma profissão via escola de música que mantinha   junto à filarmônica, fato importante para a cultura e geração de emprego em renda dos jovens da cidade. Fruto deste trabalho, as bandas militares da Polícia, do Bombeiro e do Exército tiverem em seus quadros músicos formados nas fileiras da Filarmônica João Batista Prado. 
Lauro Rocha tinha uma preocupação pelo menos favorecido, em especial o povo da “Cidade Baixa”, operários das fábricas de tecidos como as fábricas São Gonçalo, Nova e fábrica velha do grupo Pedro Amado”. Estas duas indústrias representaram muito para a economia e cultura profissional da sociedade sancristovense por décadas e nessa esteira dos acontecimentos vem a evolução tecnológica, falta de investimento em ambas e o pior o fechamento. A fábrica velha resistiu um pouco mais, justo na primeira Gestão de Lauro Rocha. A única que restava fechou e assim vieram mais desemprego e crise social. Alguns profissionais mais jovens buscaram outras cidades como Aracaju, Neópolis e até outros estados – Bahia, Piauí, Rio de Janeiro, São Paulo. Alguns operários faltavam pouco tempo para se aposentar e já considerados velhos para o mercado de trabalho dificilmente encontrariam outro emprego. Essa realidade levou Lauro Rocha a fazer uma de suas grandes obras para o seu povo.  Reuniu-se com todos e os autorizou a fazer a Inscrição Individual de Contribuição Previdenciária (assunto que ele conhecia como ninguém). Assim fizeram e pagaram mensalmente até completar o tempo que cada um dos beneficiários precisava para a aposentadoria. Muitos foram os agraciados com essa ação social e humanitária na época.

Na sua gestão, outro registro importante que merece destaque, o servidor público tinha prioridade, quanto aos direitos e salários. Rigorosamente não atrasava e a determinação ao corpo técnico era só liberar pagamentos de fornecedores outros depois que o recurso da folha do servidor estivesse com os recursos garantidos. Quando isso não acontecia, usava de amizade pessoal junto à Empresa NORCON, na pessoa de Dr. Luiz Teixeira e solicitava dele um Empréstimo pessoal (na época era possível). Dessa forma, garantia o pagamento em dia. Não permitia o atraso.
Quanto à arrecadação de tributos, essa área foi mais um marco na sua gestão. Na primeira, em 1977, implantou o Setor de Tributos. Aprovou junto à Câmara de Vereadores o Código Tributário Municipal e o Código de Posturas. Por meio de uma parceria com os Governos Federal e Estadual, os quais lhe deram apenas apoio logístico, realizou o primeiro cadastramento imobiliário em toda área urbana da Cidade e nos Loteamentos (momento que despontou) nos limites com Aracaju e Nossa Senhora do Socorro. Com esta implantação muda-se a cultura do município com relação aos impostos (IPTU, ISS, TAXAS, ALVARÁS) e que até hoje é referência para as demais cidades de Sergipe. Poucos, pouquíssimos têm o setor tributário devidamente instalado.
Em 1990, São Cristóvão estava celebrando 400 anos de fundação da cidade. A sua gestão organizou uma grande festa cívica e Cultural, levando ao povo sancristovense o sentimento de pertencimento, autoestima, valorizando a cultura local. Neste ano, foi feito um inventário dos nomes das ruas da cidade, trazendo assim a curiosidade com a justificativa do nome antigo e o nome novo da rua a exemplo: Rua Prof. Leão Magno, antiga rua do Sol; rua Messias Prado, antiga rua das Flores.
Lauro Rocha era um servidor de dar exemplo.  Era o primeiro a chegar à Prefeitura e normalmente o último a sair.  Percorria as ruas de todo o centro histórico e dos bairros quase que diariamente. Isso era determinante para que ao chegar à sede da Prefeitura, determinasse providências de correções (reparos na iluminação pública, troca de lâmpadas queimadas, varrição de ruas sujas, melhorias nas pavimentações etc. Até o livro de ponto ele verificava). Era este o cidadão, o prefeito, o amigo de São Cristóvão.
Estes fatos foram narrados com muito entusiasmo por Valmir Passos, um amigo, um ex-colega de trabalho que se sente honrado em ter contribuído tanto com a sua gestão, quanto nesta homenagem que estamos aqui fazendo. Valmir foi testemunha ocular desta história e brinda-nos relatando como foi construída sua admiração e respeito pelo homem público Lauro Rocha de Andrade.
Em entrevista à Agência PRB Nacional, publicada em 12 de setembro de 2016, o político republicado Lauro Rocha, como assim foi chamado na reportagem, relata que a sua vida. Da infância humilde, ao jovem da Marinha no Rio de Janeiro ao retorno à Sergipe e sua entrada na vida pública.
“Quando retornei para São Cristóvão, logo após o golpe militar em 1964, participei diretamente da eleição de 1966. Na época, nosso partido teve mais votos que o candidato da Arena, que representava a situação. Seis anos depois, fui candidato a vereador por Aracaju, para ajudar o MDB a conquistar mais espaço na capital, mas não fui eleito. Em seguida, já em 1974, me candidatei a deputado federal e também não obtive êxito”.
Lauro ainda relata que em 1976 disputou a eleição para prefeito de São Cristóvão, sendo eleito para governar a cidade por seis anos. Naquela época, o mandato era de seis anos, ficando no cargo até 1982. Foi eleito para deputado estadual, ocupando o cargo de segundo secretário da mesa diretora da Assembleia Legislativa de Sergipe.
Ele conta que engajou no Movimento das Diretas Já. Começou em maio de 1983 e foi até 1984, tendo mobilizado pessoas não só em São Cristóvão, mas em outras cidades sergipanas, em comícios e passeatas. Mesmo sendo marcado por significativo apelo popular, o processo de eleições diretas só ocorreu em 1989.  Em 1988, nas eleições municipais, foi eleito para seu segundo mandato a prefeito de São Cristóvão, assumindo em 1989 e concluindo em 1992. Era agora o período de mandato de quatro anos, fruto da Nova Carta Magna.
Na sua narrativa, seus olhos brilhavam e  sempre com  uma dose de bairrismo em seus relatos sempre repetindo que “a cidade que nasci e me criei precisava melhorar, e que  a política era o meio de poder proporcionar ao povo mais emprego e renda, uma melhor qualidade de vida para a população sancristovense”.  Por isso, mesmo com uma idade acima de 80 anos ainda respirava vontade política de disputar um preito, dizendo que o prefeito é servidor do povo e precisa trabalhar para o povo.
Eu, em algumas conversas que tive com Sr. Lauro, mais para saber particularidades sobre meu pai, o qual estou escrevendo e Sr. Lauro o conheceu muito bem, ainda afirmava que éramos parentes. Ele me contava em conversa formal que sua motivação a cuidar da cidade vem do histórico dela, e da necessidade de tudo que o povo precisa. Certo momento disse: “Nós moramos numa cidade que já foi a capital do estado. É a quarta cidade mais antiga do país; elevada à categoria de Cidade Histórica pelo governo estadual em 1938 e tombada pelo Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em 1967, sem esquecer que em 2010 foi reconhecida como Patrimônio Mundial. Esse potencial ainda não foi aproveitado!”
Lauro Rocha de Andrade faleceu na noite da quinta-feira do dia 4 de junho de 2020, com 83 anos. Desde o final de maio, ele estava internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de um hospital particular de Aracaju, em tratamento contra uma infecção bacteriana, mas também chegou a apresentar sintomas de Covid-19.  Senhor Lauro Rocha faria 84 anos em julho. 
 Deixa esposa, filhos e muitos amigos. Todos com bastante saudade e com muito orgulho de ter no coração e na mente a figura imortalizada de um homem que fez valer a pena sua linda trajetória de vida pessoal e pública.
Adailton Andrade – Historiador
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Fonte  de pesquisa :   Valmir Passos , Contador  e memorialista . 
Alex Rocha, seu filho.

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