sexta-feira, 28 de dezembro de 2018

MARUIM ABRE SUAS PORTAS E SEU COMERCIO PARA OS IMIGRANTES



MARUIM ABRE SUAS PORTAS E SEU COMERCIO PARA OS IMIGRANTES.  01 


Em 1836, o presidente da Província de Sergipe, Fernandes de Barros, fez a defesa da importância de levar colonos e empresários estrangeiros para Maruim, a fim de acelerar o processo de desenvolvimento econômico daquela área do Vale do Continguiba, que florescia com a economia açucareira (SILVA, 1994, 92). Ainda na primeira metade do século XIX a imigração alemã teria forte presença na cidade e contribuiria de modo definitivo para o aumento da riqueza econômica local, fazendo de Maruim aquilo que os seus memorialistas costumam chamar de “o empório de Sergipe” (SILVA, 1994, 92).
Os alemães que se estabeleceram em Maruim eram artífices especializados, engenheiros, comerciantes, médicos e operários que exerceram grande influência na vida local e produziram uma descendência que possibilita a convivência em Sergipe de pessoas com sobrenomes notoriamente alemães como Hagenbeck, Munck, Löeser e outros.


Os primeiros alemães que se fixaram em Sergipe chegaram no ano de 1839. Eles optaram por viver na Vila de Maruim, o principal porto comercial existente na Província, responsável pela exportação do açúcar. Quase todos os estrangeiros chegaram àquela Vila viajando em patachos, escunas e brigues, as principais embarcações de dois mastros usadas à época. O Livro de Registro de Estrangeiros de Maruim[i] dá conta do registro, em 1840, de Peter Heinrich Holtermann, um comerciante solteiro, com 51 anos de idade, nascido em Hamburgo. Um ano depois, em 1841, chegou Johann Heinrich Winter, outro comerciante solteiro, com 27 anos de idade, nascido em Hannover. O comerciante Gustav Wiesdesmann chegou a Maruim aos 34 anos de idade, solteiro, em 1847. No final da década de 40, em 1849, chegou Henrismann Kotsch, com 30 anos de idade, nascido em Hannover.
Quando o presidente da Província, Inácio Barbosa, estava transferindo a capital de São Cristóvão para Aracaju, em 1855, os principais centros em torno dos quais gravitavam os negócios econômicos sergipanos eram Laranjeiras, Maruim e Estância (RODDEWIG, 2001).

 Os alemães ganharam maior visibilidade em Maruim, depois da instalação da casa A. Schramm & Co., dedicada a exportação de açúcar e importadora de mercadorias industriais e outros manufaturados europeus. A empresa teve como fundadores, em 1831, em Pernambuco, os irmãos Adolph e Ernst Schramm. Este último era o mais novo dos cinco filhos de Johann Gottfried Schramm e acompanhou o irmão Adolph, em 1812, quando este resolveu fixar residência no Brasil. Transferindo sua sede para Maruim, a empresa estabeleceu filiais em Salvador, Recife, Rio e Hamburgo. Em Maruim, Laranjeiras, Aracaju e Japaratuba os Schramm foram proprietários de trapiches (Grande, Dois de Julho, Quaresma, Santa Maria, Vitória, Maior, Magalhães e Melo) e arrendatários de barcos que transportavam a sua produção e as mercadorias que comercializavam entre os portos de Maruim, Laranjeiras, Aracaju, Recife, Salvador, Rio de Janeiro e Hamburgo. Além disso, a firma A. Schramm & Co. funcionou também como casa bancária, financiando “a produção dos engenhos e de outros estabelecimentos agrícolas e, possivelmente, a própria produção açucareira” (PASSOS Subrinho, 2000, 46). No ano de 1869, o mais importante descaroçador de algodão em funcionamento na Província de Sergipe, era movido a vapor, com capacidade diária de processamento de 600 arrobas e estava instalado em Maruim, como um dos negócios da empresa Schramm.

A sede da empresa, em Maruim, estava localizada “à margem esquerda do raso, tranqüilo e turvo Ganhamoroba, mirando-se no espelho liquefeito de suas águas salobras”, onde estava edificado um “suntuoso solar teutônico” (AGUIAR, 2004, 148). Ernst instalou a sede da empresa em Maruim, no ano de 1839. Na década seguinte, seu irmão Adolph retornou à Alemanha e assumiu a direção da filial da firma em Hamburgo.



Transplantada das margens dos rios Weser e Elba para aqui, a burguesia comercial dos Schramm logo tão intimamente se adaptou ao meio maruinense, que, dentro de poucos anos, aquela casa, de estrangeiro só lhe restava o nome, e de alemães a opulência doméstica, a robusta beleza heril das damas e o sonho imperialista que trabalhava as loiras cabeças dos seus afáveis gerentes (AGUIAR, 2004, 148-9).
Os negócios da casa Schramm começaram a se reduzir na última década do século XIX, até que desaparecessem por completo. Todavia, durante toda a segunda metade dos anos oitocentos, a empresa foi um importante elemento de dinamização da economia sergipana. Segundo o pesquisador Josué Modesto dos Passos Subrinho, “entre as diversas atividades econômicas da Casa Schramm em Sergipe, há a suspeita, lançada por concorrentes britânicos, de participações no tráfico negreiro internacional” (FREITAS, 1991, 38).
 Até retornar definitivamente à Alemanha na década de 60 dos anos oitocentos, Ernst fez apenas três viagens ao seu país de origem.



Na segunda viagem, voltou desiludido, pois sua tentativa de noivado fracassara. Somente na terceira visita, já com idade de 46 anos, teve sucesso em conseguir uma noiva alemã, disposta a compartilhar seu destino nos trópicos. Chamava-se Adolphine Jencquel, descendente de uma família de comerciantes há muito tempo estabelecida em Hamburgo (FREITAS, 1991, 5).
O casamento de Ernst e Adolphine aconteceu em setembro de 1858 e antes de chegar ao Brasil o casal passeou, em lua de mel, por Londres e Paris. Era comum, desde o início do século XIX, que os alemães vivendo no exterior tivessem esposas alemãs. Porém, normalmente esses casamentos ocorriam com mulheres alemãs também imigrantes e que já viviam fora do seu país. Era raro, no início dos anos oitocentos, que os homens alemães viajassem para a Europa, a fim de casar, trazendo a sua esposa para países como o Brasil. Porém, na metade do século XIX o fato não causava mais qualquer estranhamento. Da união de Ernst e Adolphine nasceu o maruinense Max Schramm, em outubro de 1861.
O poderio econômico dos Schramm colocou a família no centro de tomada de decisões do poder político local, chegando um deles a ocupar a função de Cônsul da Alemanha em Sergipe. Essa inserção social era alimentada pela reputação de mecenas que obteve Otto Schramm e que deixou marcas em benfeitorias como a doação do relógio e do órgão de tubos da Igreja matriz maruinense, ambos procedentes de Hamburgo (RODDEWIG, 2001). Esse decantado gosto pelo mecenato, alimentado por Otto Schramm, é apontado por alguns autores como responsável pela fundação de uma das mais importantes instituições culturais de Sergipe no século XIX, o Gabinete de Leitura de Maruim: de palestras mais ou menos galvanizadas de românticos temas, entre as elegantes palmeiras e os esquisitos tinhorões do parque ajardinado daquele delicioso solar, aos serões domingueiros, foi que, consegui informar-me de fontes autênticas, surgiu a idéia da fundação do (...) Gabinete. Invejável e bem fadada sorte a desta nobre instituição literária, desabotoada em pensamento entre os roseirais e murtas em flor (AGUIAR, 2004, 149).

Há alguns indícios que podem servir como evidências que apontam na mesma direção adotada pelo memorialista Joel Aguiar. A ata de fundação do Gabinete de Leitura de Maruim, lavrada em dezenove de agosto de 1877, destaca a presença, entre os instituidores da agremiação, do comerciante Otto Schramm. Por outro lado, liderando a comunidade alemã residente em Maruim, ele abria as portas da sua casa aos compatriotas, que ali desfrutavam de um ambiente cultural tipicamente alemão, como descreveu sua cunhada, Adolphine Schramm, mulher do seu irmão Ernst:
Encomendamos uma seleção de livros interessantes, agora lidos por todos os participantes da nossa pequena colônia alemã. Parece uma pequena biblioteca. Sou muito exigente em relação ao regulamento: o livro emprestado deve sempre ser devolvido para se receber outro da minha mão (FREITAS, 1991, 27).
Adolphine era uma mulher criada em ambiente burguês, que gostava do luxo e era dada a desfrutar de muito conforto material. Ela mesma assumia isso, em diversas ocasiões, a exemplo de uma carta que enviou à sua irmã, no dia cinco de fevereiro de 1861, comentando as privações da vida social maruinense: “sempre dei grande valor à chamada vida mundana. Amei o luxo e, facilmente, fui seduzida pelo que se chama de gente” (FREITAS, 1991, 30). O poderio econômico e a refinada educação que recebera em seu país de origem faziam com que o casal Schramm mantivesse hábitos sociais que impressionavam a vida maruinense do século XIX e, mais do que isso, chamavam a atenção mesmo de pessoas acostumadas a conviver em ambientes europeus sofisticados, como o médico alemão Robert Ave-Allemant descreve no seu trabalho Viagem ao Norte do Brasil:



Se quisesse, porém, descrever Maruim, conforme me receberam, bastaria recordar como Ulisses foi recebido pelos fenícios. A primeira casa que visitei foi o estabelecimento comercial do Sr. Schramm. Bastou realmente dar meu nome, para me ver, no mesmo momento, cercado de amáveis alemães e sentado com eles a uma farta mesa de jantar, cujas escolhidas iguarias, a presença de jovem e amável dona de casa alemã tornava ainda mais saborosa. Depois dessa amável recepção, saí pela cidade com um dos alemães presentes, o Sr. Winter, o muito antigo associado da firma Schramm, para a casa de campo do Sr. Schramm, onde o encontrei e sua esposa, chegada com ele, havia poucos meses, de Hamburgo, pela Bahia, uma senhora cuja nobreza e distinção não chamam a atenção só no Brasil, e, sim no Norte também. Em parte alguma em toda minha viagem me foi grato um amável acolhimento, tão verdadeiramente restaurador como em casa do Dr. Schramm em Maruim (AVÉ-ALLEMANT, 1961, 92-99).
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fonte de  pesquisa: 
file:///C:/Users/ADAILTON/Desktop/Jos%C3%A9_Francisco_Santos.pdf 
JOSÉ FRANCISCO DOS SANTOS - Monografia apresentada ao curso de Bacharelado e Arqueologia do Departamento de Arqueologiada Universidade Federal de Sergipe, como requisito para a obtenção do título de Bacharel em Arqueologia. Orientação: Prof. Dr. Paulo Fernando Bava de Camargo.